Por Wênia Bandeira/Agência de Notícias Alese
A Assembleia Legislativa de Sergipe, através da Comissão de Educação, Cultua e Deporto, realizou, nesta segunda-feira (27), a Audiência Pública com o tema ‘Os 20 anos da Lei Nº 10.639/03 e a luta por uma educação antirracista’. A Lei inclui, na grade curricular das escolas de ensino médio do estado, os assuntos relacionados à cultura afro-brasileira.
“Essa lei que está fazendo 20 anos é muito importante para discussão da história, da cultura, da identidade afro-brasileira para que contribua para o fim do preconceito, racismo estrutural que infelizmente o Brasil comete, fazendo com que a população sofra tanta violência e tanta exclusão social, principalmente em espaços de poder na nossa sociedade”, destacou a autora da propositura, deputada Linda Brasil (Psol).
A parlamentar ainda lembrou que o povo negro, após o fim da escravidão em 1888, não teve o apoio necessário para iniciar a vida livre de forma efetiva. Os ex-escravos tiveram problemas para trabalhar, estudar e se educar, questões importantes para se integrar à sociedade.
“O racismo é estrutural, uma consequência de 300 anos de escravização do povo negro, da população africana, que foram perseguidos e torturados. Depois da tal libertação, não tiveram garantidos seus direitos, seja trabalhista, seja de moradia, para que a gente pudesse viver numa sociedade mais igualitária”, afirmou.
O coordenador do Coletivo Antirracismo do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Básica do Estado de Sergipe (Sintese) e representante da categoria de professores no Conselho de Políticas de Igualdade Racial de Sergipe, Roberto Amorim, falou que é de suma importância debater esse assunto na Alese pelo que o tema representa.
“O racismo é político e esse viés político introjetou nas questões simbólicas do nosso povo e proporcionou um olhar, ou seja, quando eu chego em um determinado ambiente, com a minha cor, eu trago esteriótipos, alguns adjetivos que não são qualificativos. Isso é um processo de naturalização simbólica”, disse.
Por este motivo, ele afirmou que é preciso colocar em prática a Lei Nº 10.639/2003 de forma completa. Roberto Amorim acrescentou que o aspecto que o Brasil apresenta, na parte econômica, social e política é bastante desigual em relação a mulheres e homens negros e um dos fatores fundamentais é combater as estruturas racistas desse país.
“Um dos polos fundamentais dessa estrutura racista que nós estamos pleiteando é a lei 10.639 porque ela infere diretamente no processo de educação, formação dos nossos jovens, em um momento em que há ocultação da cultura, da arte e do processo de formação. É um momento ímpar em que o estado brasileiro apresenta uma dívida com homens e mulheres que vieram da África. É um momento de reflexão não só das pessoas negras, mas também das brancas que muitas vezes praticam atos racistas imbuídos pela cultura, pela naturalização em determinados lugares, então é uma construção coletiva e que vai elevar não só a humanidade do negro, mas a de todos”, declarou.
A professora Deise Nascimento lamentou precisar falar sobre este assunto após tantos anos do fim da escravidão. Ela comemorou a presença de alunos assistindo o debate já que é deles a responsabilidade de formação da sociedade no futuro.
“É fazer com que a gente tenha futuro melhor, fazer com que esses jovens possam absorver a necessidade de valorizar a cultura afro-brasileira e entender que ela faz parte do nosso contexto, da nossa formação e raiz. Então não é um ato apenas para ilustrar, mas compreender que a nossa sociedade foi formada a partir da presença, da participação negra e que deve ser valorizado e cada mais referenciado nas nossas salas de aula para que nossos alunos possam compreender a necessidade de não praticar ações racistas”, falou.
Os alunos estudam no Centro de Excelência Atheneu Sergipe. São 26 anos estudantes do segundo ano de ensino médio que foram levados ao evento pela professora de história Sheila Rodrigues como complemento ao que já estudam diariamente na sala de aula.
“A gente já faz um trabalho na escola no dia a dia, eu trouxe todos para ver a história acontecer assim, ao vivo, de perto, sobre a questão da cultura negra, dos direitos, da luta. E a gente não pode parar, tem projetos de cultura negra que a gente fala sobre todas as questões culturais, sociais, esse tema étnico que acompanha o nosso povo”, disse.
A aluna Juliana Souza, 17 anos, destacou a necessidade de conhecer sobre este assunto. Ela falou que, desta forma, é possível conhecer mais do que muitos livros didáticos deixam de informar nas aulas de história anteriores.
“A gente sabe que educação é o caminho para que a gente possa ter esse emblema de história e de pertencimento. A partir do momento que a gente começa a conhecer a nossa verdadeira história que muitas vezes através de livros didáticos é apagada, essa lei vem como uma garantia que nós brasileiros, estudantes principalmente, devemos conhecer a nossa ancestralidade para que nós tenhamos esse conhecimento do quão importante é a cultura afro-brasileira na nossa raiz”, afirmou.
O aluno Luciano Ferreira, 16 anos, acrescentou que se trata de um racismo estrutural, repassado de geração para geração, o que o tornou forte desde sua essência. Ele falou que estudando estas informações é possível acabar com o preconceito perpetuado na sociedade.
“O racismo estrutural vem desde as grandes navegações, o marco temporal do racismo que temos hoje em dia. Pessoas de outras gerações têm essa mentalidade de preconceito porque é o que foi passado de geração a geração. A escravidão aconteceu anos atrás, mas o racismo continua, se perpetua, então a juventude, com o advento da internet e das redes sociais, tem uma gama de possibilidades para entender mais o que é esse racismo e conseguir parar”, declarou.
A Audiência Pública foi realizada na Sala de Comissões Deputado Guido Azevedo.
Fotos: Joel Luiz/Agência de Notícias Alese