Por Ascom Parlamentar
Em homenagem ao Dia Mundial de Conscientização do Autismo, a Assembleia Legislativa promoveu nesta terça-feira, 2, uma audiência pública sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Proposta pelo deputado estadual Luciano Pimentel, a audiência colocou em debate as barreiras criadas pela falta de informação e a necessidade de efetivação dos direitos da pessoa com TEA, que ainda não são respeitados em Sergipe.
Realizando a abertura da audiência, Pimentel recordou que em março se reuniu com pais e mães de autistas e pode ouvir as dificuldades enfrentadas por eles em nosso Estado. “A partir desse encontro, começamos a intensificar o trabalho, que iniciamos no mês de fevereiro, em prol da conscientização e da regulamentação de direitos em Sergipe”, rememorou Pimentel, continuando.
“Essa atuação já tem rendido frutos como o Projeto de Lei 32/2019, que aguarda apreciação nesta Casa e visa o atendimento preferencial, e a propositura da composição de uma Frente Parlamentar para que possamos, durante os quatro anos do mandato, tratar desse tema aqui na Alese”, explanou.
Segundo Pimentel, “a audiência foi pensada exatamente para dar continuidade a essa atuação e abrir um amplo debate sobre o autismo e a necessidade de apoio do poder público e da sociedade civil, objetivando a busca de alternativas que possam melhorar a qualidade de vida dos autistas em nosso Estado”, considerou.
Direitos da pessoa com TEA
A legislação brasileira já concede ao autista as garantias para auxiliá-lo a levar uma vida digna. A Lei 12.764/2012, por exemplo, instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA, estendendo a essa parcela da população os mesmos direitos previstos para as pessoas com deficiência.
Com foco nesse aspecto, o advogado Bruno Leonardo, explicou que a lei em questão, conhecida como “Berenice Piana”, estabelece a obrigatoriedade do diagnóstico precoce e tratamento multidisciplinar, além determinar que a pessoa com TEA não poderá ser impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição.
“Infelizmente, alguns planos de saúde buscam limitar tratamentos imprescindíveis ao desenvolvimento regular do autista, a exemplo de sessões terapêuticas, mas o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento frisando que as operadoras podem estipular quais grupos figuram no contrato de seguro, porém não devem praticar qualquer tipo de ingerência médica”, destacou Bruno, citando uma ação por danos morais movida em Aracaju em virtude da negativa de um plano de saúde.
Em sua explanação, o advogado apresentou ainda algumas leis que versam sobre benefício de prestação continuada, atendimento preferencial, descontos em passagens, isenção de impostos para aquisição de veículos, além da inclusão escolar e a inserção no mercado de trabalho.
Medicina e Família
Presidente da Sociedade Sergipana de Pediatria, Glória Lopes, apresentou uma fala a partir do olhar da medicina pediátrica, expondo um pouco das histórias que fazem parte da sua vivência profissional, desde a percepção dos primeiros sinais do TEA e até as principais reações das famílias que chegam a seu consultório.
“Muitas vezes somos nós, pediatras, que realizamos esse primeiro diagnóstico do autismo, a partir da análise de sinais que se enquadram no TEA, e procuramos orientar os familiares para necessidade de iniciar um tratamento multidisciplinar”, disse Glória.
Pós-graduanda em TEA, a pediatra e mãe de autista, Karen Mendonça, relatou um pouco de sua experiência profissional e pessoal com o autismo, realçando a importância do diagnóstico precoce para o pleno desenvolvimento das pessoas com o transtorno.
“Apesar de já ter instrumentos para o diagnóstico precoce, as estatísticas mostram que a maioria deles é feita entre os cinco e sete anos. O que acaba atrasando a evolução do tratamento. Isso porque, sabemos que o desenvolvimento neurológico acontece com uma velocidade maior nos primeiros anos de vida e a neuroplasticidade, a capacidade de aprender, também. Então, quanto mais precoce ocorre esse diagnóstico, consequentemente, melhores serão os resultados do tratamento”, enfatizou.
Presidente da Associação de Amigos do Autista de Sergipe (AMAS) e pai de um adulto com TEA, José Flávio, destacou que discutir o tema é fundamental, pois a falta de informação faz com que as famílias não tenham seus direitos cumpridos. “Para nós, que somos pais de autistas, é de muita importância para que os poderes constituídos venham a ter uma visão melhor e maior sobre o autismo em Sergipe, porque fomos renegados ao segundo plano e não temos a quem recorrer”.
Inclusão Educacional
Doutora em educação e pesquisadora na área de inclusão, a professora Rita de Cácia Souza, abordou o conceito do TEA sob o viés da psiquiatria e apontou algumas perspectivas relacionadas à prática educacional, reforçando a relevância da acessibilidade no processo de evolução das crianças diagnosticadas com autismo.
“Quando a criança chega à escola e já possui diagnóstico, a mesma compreende as características gerais daquela deficiência e a normatiza, sem conhecer a criança e observar as potencialidades e suas dificuldades. Para efetivar o processo inclusivo é preciso conhecer a singularidade de cada pessoa”, pontuou.
Durante a palestra, Rita de Cácia ressaltou que a aprendizagem e o desenvolvimento acadêmico das pessoas com TEA é possível e real. “O que muda são os caminhos, as metodologias e as estratégias que serão utilizadas para efetivar a educação”.
Na ótica da pesquisadora, para alcançar avanços nesse campo é preciso investir na formação docente. “Ainda temos muito o que evoluir em torno da construção de metodologias de ensino que se adequem ao funcionamento cerebral diferenciado dos autistas, às comorbidades, que em cerca de 70% dos casos, vêm associadas e à diversidade de possibilidades de características e intervenções que se impõem”, afirmou Rita.
Importância da Terapia
Pós-Graduada em Ciência do Comportamento pela George Brown College (Canadá) e especialista no Método ABA (Análise Comportamental Aplicada), Isis Bacelar, focou sua palestra na terapia como ferramenta essencial para evoluir no tratamento do TEA.
“O ABA tem como foco a análise comportamental. Ele observa a forma de agir dos indivíduos, a frequência e duração de cada ação, para traçar um planejamento terapêutico específico. Além disso, o ABA trabalha muito com o reforço positivo e negativo, buscando aumentar ou reduzir a probabilidade de um comportamento se repetir”, explicou Isis.
De acordo com ela, através da aplicação desse método, é possível obter resultados em diversas áreas, a exemplo da acadêmica e motora. Para terapeuta, o ABA se destaca por estruturar a metodologia visando o que é benéfico para o indivíduo a longo prazo.
“A gente tem o costume de pensar no autista sempre no aspecto da criança, mas precisamos lembrar que eles irão crescer. Dessa maneira, é fundamental que possamos ajudá-los a se tornarem adultos presentes na sociedade”, ressaltou Isis.
Por fim, ela frisou que, nesse sentido, a terapia é essencial para transformar as pessoas com TEA em indivíduos ativos. “Não podemos continuar enxergando o autista como alguém que estará sempre à margem, que não irá ter um emprego ou participar da vida em sociedade. Precisamos contribuir para eles estejam inseridos nos ambientes sociais e possam viver com qualidade”, concluiu.
TEA
O autismo é identificado na infância, entre 1 ano e meio e 3 anos, embora os sinais iniciais às vezes apareçam já nos primeiros meses de vida. O TEA afeta a comunicação e capacidade de aprendizado e adaptação da criança. No Brasil, estima-se que existam cerca de dois milhões de pessoas dentro do espectro. Deste total, de acordo com o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (São Paulo), mais de 90% está completamente desassistido.
Presenças
A audiência pública contou com a presença de pais, mães e especialistas das áreas de saúde e educação, além de autoridades, acadêmicos e representantes de entidades de apoio as pessoas com autismo de Sergipe.Entre os presentes, estiveram a vice-governadora, Eliane Aquino; os deputados estaduais, Iran Barbosa, Dilson de Agripino, Georgeo Passos, Kitty Lima e Diná Almeida; e os vereadores Fábio Meireles e Lucas Aribé.