01/02/2022
Por Ethiene Fonseca
A pandemia da covid-19 despertou a população mundial para várias questões relacionadas à saúde, não apenas no sentido de prevenção ao novo coronavírus, mas também no que se refere à saúde mental. Com as medidas de distanciamento social, orientadas por entidades de relevância nacional, a exemplo da Organização Mundial da Saúde (OMS), as pessoas tiveram o convívio social comprometido ou até mesmo interrompido, tendo em vistas que escolas, clubes, shoppings e outros estabelecimentos foram fechados.
Soma-se a isso o medo que a contaminação pelo vírus despertou nas pessoas, além da experiência da perda de um ente querido que muitos vivenciaram por conta da covid-19. Visando minimizar os impactos psicológicos que a pandemia tem trazido para a população, o Congresso Nacional vem apresentando algumas iniciativas sobre o tema, a exemplo do Projeto de Lei 2.083, de 2020, que tramita no Senado. O texto busca criar um programa de atenção às questões de saúde mental provocadas pelo distanciamento durante a pandemia.
Em Sergipe, temos a Lei 8.257, sancionada em 2017, de autoria da ex-deputada Ana Lúcia. O texto cria no estado a campanha Janeiro Branco, de promoção da saúde mental. Além dessa iniciativa, a Assembleia Legislativa de Sergipe aprovou outras propostas durante a pandemia, a exemplo da Indicação 211/2020, solicitando ao Governo de Sergipe a intensificação de políticas públicas de promoção da saúde, prevenção e orientação visando minimizar os impactos negativos da pandemia na saúde mental. A autoria é da deputada estadual Maísa Mitidieri (PSD).
Congresso em Pauta
O tema levantado pelo PL que tramita no Senado inclusive foi tema do programa Congresso em Pauta desta terça-feira, 1º, na TV Alese (canal 5.2). Em conversa com a apresentadora Clécia Carla, a assessora da Rede de Atenção Psicossocial de Aracaju, Mairla Protazio, destacou que muitos serviços de saúde mental tiveram que ser interrompidos em um primeiro momento, pois toda a atenção da Saúde Pública estava voltada à prevenção e ao tratamento de pessoas com covid-19. Mas, entendendo que os atendimentos psicológicos são essenciais, o poder público voltou a dar atenção a essa área.
“Ao compreender que a saúde mental é um serviço essencial, que não podia parar, e seguindo diretrizes internacionais, os serviços foram não apenas retomados, como ampliados. Tivemos em 2020 a ampliação da equipe do Consultório na Rua, que atua com pessoas em situação de rua. É importante destacar que a população mais vulnerável acaba sofrendo mais com a pandemia. Tivemos também o Serviço de Plantão Psicológico, com psicólogos atendendo de forma remota, dando um apoio à população”, informou. O serviço pode ser acessado pelo telefone 0800 729 3534, de segunda a sexta, das 7h às 19h.
Mairla defende a necessidade de mais investimentos públicos na saúde mental, citando a Portaria 3.089, de 2011. O texto, que trata sobre o financiamento dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), não sofre alterações desde a sua publicação, segundo a Associação Brasileira de Saúde Mental. A assessora explica que os acometimentos psicológicos estão diretamente relacionados a fatores sócio-históricos, sendo, por isso, necessária uma atualização das questões trazidas pela Portaria.
“Nesse tempo, muda não só a demanda, mas o perfil da pessoa que acessa esse tipo de serviço de saúde. Em 2021, completou 10 anos da publicação da Portaria 3.089. Não tivemos aumento nesse tipo de investimento. Esse é um dado que mostra como está falho o financiamento na área”, relata a assessora.
Conselho Federal de Psicologia
Quem também participou da discussão foi a presidente do Conselho Federal de Psicologia, Ana Sandra Fernandes. Sobre o PL 2.083/2020, ela defende que investimentos em atenção à saúde mental devem ser feitos não apenas enquanto durar a pandemia, tendo em vista que os danos provocados pela crise sanitária são muitos e de diversas ordens, podendo perdurar por mais tempo. A presidente complementa dizendo que é necessário investir no serviço público, fortalecendo o Sistema Único de Saúde (SUS).
“A Pandemia mostrou o papel do SUS, sendo necessários com investimentos e capacitações. Todos os projetos e serviços públicos de saúde devem ser apoiados e defendidos. É importante destacar que nós vivemos um processo de subfinanciamento de políticas públicas. Há uma inversão da lógica, com investimentos em hospitais psiquiátricos, uma política hospitalocêntrica. O serviço de atenção à saúde precisa ser feito em rede, no território, nas comunidades”, defende a presidente.
Ela alerta que essa lógica acaba por focar no tratamento da doença, sendo que a saúde envolve questões muito mais complexas do que o processo de adoecimento. A presidente acredita que não é possível falar em saúde mental sem tratar sobre outros temas, como cidadania, emprego e renda, acesso a serviços de saúde. Por fim, ela levantou a seguinte questão: como é possível negar direitos a um indivíduo e esperar que ele tenha saúde mental?
“Quando se fala em saúde mental, temos um processo muito maior. A doença é o resultado do não investimento nessa área. Temos que olhar a saúde mental nessa perspectiva mais ampla. Ela tem a ver com cidadania, garantia de direitos. Saúde é sinônimo de cidadania, de acesso a serviços, de dignidade”, finaliza.
Foto: Olhar Digital