Foi realizado na tarde desta quinta-feira, 14, no plenário da Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe (Alese), uma audiência pública de autoria do deputado Georgeo Passos (Cidadania), com foco exclusivo no cenário de violência protagonizado ao longo dos últimos anos por integrantes de torcidas organizadas. A realização deste debate se tornou possível após a morte do jovem Kaio South, de 24 anos, integrante da Torcida Trovão Azul – Associação Desportiva Confiança (ADC). Contando com a presença de deputados que compõem as comissões de Cidadania e Direitos Humanos; Segurança Pública; além da Comissão de Educação, Cultura e Desporto, a audiência foi prestigiada por representantes da Defensoria Pública de Sergipe, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP/SE), e administradores das associações e clubes de futebol.
Conforme contabilizado pelo Ministério da Justiça, durante todo o ano de 2023 foram notificados no Brasil nove óbitos envolvendo embate violento entre integrantes de torcidas organizadas rivais. Já o cenário de homicídios desta natureza entre os anos de 2003 e 2023, foram oficializadas 142 mortes em todo o país. Foco do debate, representantes das torcidas organizadas também marcaram presença na audiência pública com a finalidade de colaborar com os estudos. Na concepção de Georgeo Passos, ao promover um debate amplo, envolvendo todos os personagens que na maioria dos casos estão integrados na pauta, a tendência é que a melhor resposta para combater a continuidade destes crimes seja identificada e posta em prática. O parlamentar reverencia a Alese como peça fundamental neste diálogo.
O autor da propositura destacou ainda que, apesar de uma morte ter sido notificada em Sergipe na primeira quinzena de fevereiro deste ano, ao longo dos últimos anos – também em decorrência do posto de deputado estadual –, tem estudado este caso com a finalidade única de transformar as praças desportivas em ambientes unicamente de lazer. “É preciso reconhecer publicamente que já passou muito do tempo de resolver este problema em nosso estado. Sempre me preocupei com isso, e, em alguns momentos, já tratei do assunto aqui na Alese. Hoje, em um formato amplo e com a presença de autoridades, gestores de clubes e das torcidas, tentamos mais uma vez colaborar para que seja definitivamente conquistada a paz nos estádios”, destacou Georgeo.
Sem mudar a forma de pensar sobre a importância das torcidas organizadas, o deputado voltou a discursar em plenário a respeito da atividade social que estes grupos promovem, sobretudo, para crianças e adolescentes nas comunidades. Paralelo à oferta de cursos de pintura e artesanato, são realizadas oficinas de musicalização – em especial com instrumentos percussivos –, dança e teatro, além de campanhas voltadas para a doação de sangue. Em referência aos conflitos violentos, Georgeo Passos, de igual modo, seguiu defendendo que, a partir do momento que houver melhor monitoramento previamente articulado e programado pela Segurança Pública, o índice de fatalidade será zerado. O parlamentar identifica falhas graves no sistema de fiscalização em locais estratégicos e abordagens preventivas.
Terminais de integração
“Este é um dos espaços que claramente faltou atenção por parte da Secretaria de Estado da Segurança Pública, e da própria Guarda Municipal de Aracaju. Observem que todo domingo tem duas ou até três viaturas no terminal da Atalaia; isso é ação preventiva, já que o local é muito movimentado nos finais de semana. Já disse e repito: se tivesse duas viaturas no Terminal do Distrito Industrial de Aracaju (DIA), muito provavelmente a briga teria sido evitada e o jovem não teria morrido”, declarou o deputado que, diante do público presente, agradeceu: “a presença de todos vocês contribui para que possamos ter de imediato um estado mais seguro, com as famílias retornando aos estádios e com registro zero de brigas e mortes. É isso o que todos nós desejamos.”
A audiência foi conduzida pelo vice-presidente da Assembleia Legislativa, deputado Garibalde Mendonça (PDT); participaram ainda os deputados: Marcos Oliveira (PL), Kaká Santos (União Brasil), e Marcelo Sobral (União Brasil), além das deputadas Maísa Mitidieri (PSD), e Linda Brasil (Psol). “Sou torcedor do Itabaiana, gosto de ir para os estádios e sou contra proibir a presença de torcidas organizadas. Agir desta forma, é contribuir para que o futebol sergipano, que já é pequeno, fique menor ainda. Acabar com as torcidas por fatos pontuais é um erro; imagine um advogado cometer um ato ilícito e ter que fechar a OAB; um policial comete um erro, e decide-se acabar com a Polícia. A solução não é essa”, destacou Marcos Oliveira.
Contraponto
Com direito de fala durante a audiência, gestores das torcidas organizadas reconheceram a periculosidade imposta por alguns associados, mas garantiram que a ausência de patrulhamento ostensivo permite que os embates sejam protagonizados. Marcaram presença as torcidas: Esquadrão Colorado (TEC – Sergipe); Trovão Azul (TTA), Torcida Jovem (TJ) e Máfia Feminina (MF) – estas ligadas ao Confiança. De acordo com Adilson dos Santos – (TJ), nos dias que antecedem jogos envolvendo clássicos, a direção solicita junto ao poder público ampliação no monitoramento em terminais de integração, na sede das torcidas e em praças que ficam nas imediações do Estádio Lourival Baptista – Batistão. O mesmo pedido se estende para os estádios João Hora e Sabino Ribeiro, ambos em Aracaju.
“Não concordamos com essa violência, mas punir todas as torcidas por atitudes de uma minoria é um erro; seguimos as orientações da Segurança Pública, as vezes mandamos mais informações que o solicitado, mas é preciso que o Estado também faça a parte dele. Sempre que tem clássico, pedimos maior fiscalização em terminais. Se vocês analisarem, no Batistão e nas ruas ao redor, a fiscalização é intensa e há muitos anos não tem nem briga”, declarou. Compartilhando com o depoimento de Adilson, a presidente da torcida feminina, Jhully Souza, pediu: “busquem soluções adotadas em estados que deram certo. Nós temos uma responsabilidade grande com o Ministério Público, Polícias e tantos outros órgãos de fiscalização. O futebol não pode ter sua torcida punida em coletivo por causa de atos praticados por poucos.”
Preocupação
Representando a Secretaria de Estado da Segurança Pública, o delegado Thiago Leandro lamentou que, além dos mais variados tipos de entorpecentes, objetos apontados por ele como utilizados em guerrilhas também tenham sido encontrados nas dependências internas das sedes destas torcidas. “Nossa preocupação sobre esse assunto não é de agora; há pelo menos dois anos temos intensificado esses estudos. Diante do risco de novas fatalidades, ações enérgicas, firmes, estão sendo adotadas, principalmente depois que encontramos nestas sedes objetos de guerrilhas, como porretes de madeira com pregos nas extremidades, bombas caseiras de intenso impacto e soco inglês. Agradecemos o convite para participar do debate, mas observamos que ainda estamos distantes do fim deste problema; precisamos intensificar esses debates em busca do objetivo geral”, avaliou.
Participaram ainda da audiência, o representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Seccional Sergipe), Ramon Costa; e o representante da Defensoria Pública Estadual, Sérgio Barreto; dirigentes do Confiança foram convidados, mas não compareceram.
Fotos: Joel Luiz | Agência de Notícias Alese